CRÔNICAS
Pesquisadora, mãe de filha e plantas, interessada por memória e temporalidades, que tenta incansavelmente se equilibrar em meio a tarefas escolares, aulas remotas, demandas de casa e da vida acadêmica, mas que descobriu que o lado bom de quarentenar em família foi reforçar a parceria e o afeto em tempos de abraços e beijos virtuais, alimentados pelas boas memórias que construímos juntos.
Luciana Amormino
“Temporalidades Em Tempos De Catástrofe: Reflexões Sobre Um Cotidiano Em Abismo”
Semana 1 – Atordoamento
“Fato é que as dimensões de incerteza, falta de controle, abertura ao intempestivo, distopia, que atribuíamos até ontem a um certo futuro – que embora sempre se fizesse presente, parecia ainda lá, um tanto quanto distante – talvez nos tenha alcançado rápido demais. E por mais que nosso imaginário sobre o futuro já estivesse povoado por dimensões distópicas, mais que utópicas, como em períodos anteriores, vivenciar essa distopia nos leva a um sentimento de atordoamento, pela falta de amparos que nos sinalizem caminhos, possibilidades ou mesmo reinstaurem a confiança de que está tudo sob controle o que, no caso do Brasil, diante do posicionamento dos governantes, fica ainda mais difícil de acontecer. Nesse sentido, o cotidiano parece estar em abismo, ou abrir-se em narrativas em mise-en-abîme, em tentativas de explicar o mundo e apreender o tempo que tentam se encaixar numa narrativa coerente, embora fragmentada, mas que, diante das fake news, desencaixam-se com a mesma velocidade. Assim, não há uma intriga coerente, um todo que dê conta de estabilizar esse cenário instável e inapreensível. E, novamente, o embaçamento toma conta de um olhar que tenta apreender o presente e vislumbrar futuros possíveis. Então, resta-nos perguntar: que novos imaginários sobre o futuro vamos construir a partir deste futuro distópico que já nos alcançou?”
19 de Março de 2020
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Semanas 15 a 18 – Entre o agir e o padecer, resistir
“Esses cem dias foram, para mim, como cem anos, não pela percepção de demora da passagem temporal, posto que meus dias, semanas e meses nunca estiveram tão agitados e acelerados, mas pela intensidade das mudanças, tanto internas, cá do meu isolamento, quanto externas. A alteração de toda uma rotina construída há muito tempo, a necessidade de me reorganizar e reinventar em meio ao caos interno e externo, as crises políticas inconsequentes e irresponsáveis, a ebulição das questões sociais que a pandemia intensificou, entre tantos outros pontos, reforçaram-me algo que sempre ouvi, mas não tinha tido uma dimensão tão clara: não temos controle de nada. Nem do nosso tempo, nem dos nossos planos, nem do nosso cotidiano, nem do nosso passado, presente ou futuro. Nesse devir infinito oscilamos entre o padecer e o agir. Entre se abrir ao que não se sabe e se cercar das experiências que nos fizeram chegar até aqui. Entre repetir e renovar. E assim, o que nos cabe é resistir.”
09 de Julho de 2020
NOTA
A finalidade do projeto é servir como registro das narrativas produzidas no período da quarentena em espaços on-line, por isso algumas das imagens podem conter conteúdo sensível ou de caráter discriminatório. Elas se encontram nesse compilado com fim reflexivo.
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